sábado, 30 de outubro de 2010

"De repente" ainda se vive






Ana Bárbara Figueiredo

O repente é uma arte com vários séculos de existência e especialmente no Brasil tem uma maior presença na região Nordeste. Esta tradição folclórica, com o passar dos anos, foi perdendo força e, hoje, principalmente os jovens não conhecem e não sabe a sua importância, o mercado musical tem as portas praticamente fechadas para esta arte. Apesar destas dificuldades, a tradição vem sendo mantida e em Feira de Santana, especificamente, os irmãos Caboclinho e João Ramos são os grandes expoentes e principais divulgadores na região.

José Ramos, o Caboclinho, 64 anos, e João Ramos, 58 anos, são considerados os guardiões do repente em Feira de Santana. Além de estarem à frente da Associação de Repentistas, são os principais organizadores dos festivais de violeiros, que hoje é o principal instrumento de divulgação da cultura na nossa cidade e região.

Tudo teve início com o senhor Crispim Manoel Ramos, o Seu Dadinho, um homem do campo, vaqueiro, peão, puxador de samba de roda, que formou dupla de violeiros com o repentista Abdias Soares, lá nos idos 1945. Movido pelo desejo de seguir os passos artísticos do pai, José Ramos, o Caboclinho, começou a cantar e a dedilhar sua viola aos 14 anos de idade e a acompanhá-lo nas andanças pela região.
A parceria durou 35 anos, até que seu Dadinho, idoso e não agüentando mais fazer viagens longas, aposentou sua viola. Caboclinho, então, passou a cantar com seu irmão João Ramos, formando a dupla que já dura 15 anos.

Em 1968 Caboclinho e Dadinho começaram a apresentar um programa de rádio na Sociedade AM, que levava o nome da dupla, onde eles cantavam, recebiam amigos e parceiros da arte do repente. O mesmo programa, por um curto período de tempo, foi para a Rádio Cultura e depois voltou para a Sociedade. Com o falecimento de Seu Dadinho, em 2003, João Ramos passou a participar do programa, que passou ser chamado Caboclinho e João Ramos. No total, a família Ramos atuou por 40 anos no rádio feirense.

Depois de ter atuado por quatro décadas como radialista, acumular cinqüenta anos de repente, ser professor e advogado, Caboclinho afirma que gosta de tudo que faz. “Mas é o repente que mais me realiza”, garante.

Por seu lado, João Ramos também tem atividades paralelas a sua vida de artista. Graduado em Ciências Sociais pela Uefs, professor do Estado, ele leciona História, Geografia e Educação Física no Centro Integrado de Educação Assis Chateaubriand, é instrutor de artes marciais, professor de Karatê e faixa preta 5º dam.

DIFICULDADES

Visando abrandar as dificuldades inerentes à atividade de repentista, em 1975 os irmãos Ramos e colegas da região fundaram a Associação de Violeiros e Trovadores da Bahia. Mas, por não ser lucrativa, os demais associados foram aos poucos se afastando, até restarem apenas os irmãos. Atualmente, o presidente é o cordelista e repentista João Ramos. A AVTB não possui nenhuma sede de fato, nem associados. Ela funciona no escritório de advocacia de Caboclinho e no escritório da academia do presidente da associação. “É uma associação amadorista e nós somos os amadores”, brinca presidente.

Mesmo com a aprovação da lei 12.198, em 14 de Janeiro de 2010, que reconhece as atividades de repentista, cordelista e cantador como profissão, até hoje nada foi posto em prática em benefício desses artistas. Os irmãos acreditam que a situação poderá mudar em breve. “Até o momento, nada mudou. Desta Lei não conseguimos sequer patrocínio para o Festival de Violeiros, que ocorre todo ano”, afirmou João Ramos.

Eles garantem que fazem tudo por amor, por gostar da profissão e que não recebem nenhum incentivo do Estado. Apenas quando realizam o Festival de Violeiros do Nordeste é que recebem uma ajuda de custo da prefeitura municipal de Feira de Santana. Porém, já ocorreu dessa contribuição oferecida pela prefeitura não dar para cobrir os gastos e eles terem que sair pedindo ajuda ao setor privado. “Além dos artistas de nosso Estado, são convidados violeiros e repentistas de outros estados e eles precisam ser remunerados, pois alguns deles vivem exclusivamente disso e, quando não dependem somente de sua arte, precisa um de um complemento”, explicou João Ramos.

O Festival de Violeiros do Nordeste acontece há 35 anos, geralmente no mês de agosto, em Feira de Santana. Este ano, devido às eleições, deverá ocorrer no dia 30 de outubro. “Apesar da enorme dificuldade, nós saímos distribuindo convites para as pessoas e para as autoridades, pedindo de programa em programa, para que a festa possa ter seu valor reconhecido”, garante João Ramos.

Mas eles não desistem e aguardam um tempo em que os órgãos responsáveis pelo fomento à cultura dêem a devida importância à arte produzida por eles e seus companheiros de jornada.

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